O controle do Ipea
Com a conclusão do concurso para a contratação de 62 técnicos de planejamento e pesquisa e mais 18 funcionários estáveis - o maior de toda a história da instituição -, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) avança mais no processo de "padronização ideológica" iniciado quando passou do Ministério do Planejamento para a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo, chefiada pelo ministro Roberto Mangabeira Unger. É o que mostra o levantamento feito pela repórter Julia Duailibi do currículo dos aprovados no concurso, publicado há dias pelo Estado.
A "padronização ideológica" do Ipea vem sendo denunciada pelos pesquisadores independentes e pela imprensa desde abril de 2007, quando a instituição passou para a Secretaria criada especificamente para abrigar, no governo do PT, o polêmico filósofo Mangabeira Unger, que pouco antes chegara a pedir o impeachment do presidente da República.
Ela se intensificou com a nomeação, em agosto daquele ano, do economista Márcio Pochmann para a presidência da instituição. Uma das primeiras decisões da nova diretoria foi suspender a publicação da Carta de Conjuntura, que publicava análises isentas dos problemas conjunturais baseadas em dados do conhecimento geral, pois esse tipo de análise poderia criar constrangimentos para o governo, visto que, naquele momento, havia pressões inflacionárias fortes. Em seguida, a diretoria determinou o afastamento de quatro dos mais respeitados pesquisadores, mas críticos da política do PT.
Reconhecido até há pouco como um dos mais importantes centros de discussão e de formulação de políticas públicas e respeitado pela diversidade de pensamento de seus pesquisadores e pelos trabalhos que publicou desde sua criação em 1964, o Ipea foi transformado num centro de legitimação das políticas do grupo mais estatizante do PT. Para isso, sua diretoria vem reduzindo o espaço para a divulgação do trabalho dos pesquisadores que discordam da visão desse grupo petista.
No início, o governo Lula respeitou o Ipea. No primeiro concurso na gestão do governo Lula para a contratação de pesquisadores - realizado em 2004, quando o Ipea era presidido por Glauco Arbix -, por exemplo, dos 44 aprovados, 26 tinham pós-graduação em economia. Dez candidatos eram pós-graduados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pela PUC-RJ, instituições criticadas por boa parte dos economistas de linha "desenvolvimentista" do PT - entre os quais Pochmann -, que as considera neoliberais e responsáveis pela formulação das principais políticas do governo Fernando Henrique Cardoso. Apenas um era pós-graduado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), da qual o atual presidente é professor e na qual fez seu doutorado.
No concurso mais recente, dos 62 aprovados, apenas 21 têm pós-graduação em economia. Dos pós-graduados em economia, não há nenhum da FGV e apenas um da PUC-RJ, mas nada menos do que 10 são originários da Unicamp. Considerados todos os pós-graduados aprovados (as áreas de conhecimentos vão da economia à ciência política e à química), a Unicamp volta a predominar, com 12 candidatos, seguida pela Universidade de São Paulo (com 8) e universidades estrangeiras (com 7). A diferença em relação ao concurso anterior é notável.
O lançamento do concurso, em setembro, foi motivo de muitas críticas, inclusive de pesquisadores do Ipea, pois os critérios então apresentados indicavam a busca de "padronização ideológica", o que os resultados finais parecem confirmar. Para, como alegou a direção na época, "mudar o perfil" dos pesquisadores, o Ipea criou sete áreas de especialização.
A prova - elaborada pelo Centro de Seleção e de Promoção de Eventos, ligado à Fundação Universidade de Brasília e que se encontra sob fiscalização e auditoria do Ministério Público Federal e da Controladoria-Geral da União - tinha perguntas sobre comércio legal de veneno de cobra e sobre cavalos marinhos, na especialidade de sustentabilidade ambiental. No geral, foi considerada de nível baixo, sem a exigência de nenhum conhecimento aprofundado, de acordo com o professor de economia da PUC-RJ Joaquim Guilhoto. Na sua opinião, "foi uma prova muito rasteira".
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