19 de set. de 2005

Bastiat e o furacão

Assistia eu, no final da noite de domingo, ao bom programa Manhattan Connection quando, horas tantas, um dos participantes da mesa redonda, o economista Ricardo Amorim, elaborou um comentário, digamos, no mínimo precipitado. Disse ele, não exatamente com essas palavras, que: a curto prazo, os efeitos do Furacão Katrina na economia norte americana serão positivos, devido aos investimentos ligados à reconstrução das localidades afetadas.
De acordo com o raciocínio do senhor Amorim, pensei cá com os meus botões, caso a América tivesse furacões diários, durante o ano inteiro, certamente seria uma nação muito mais próspera, pois conviveria constantemente com os tais "efeitos econômicos positivos" dessa intempérie da natureza.
Imediatamente, lembrei-me do incomparável Frédéric Bastiat, parlamentar e economista francês do Século XIX, que deixou para humanidade uma obra de grande sabedoria, enorme perspicácia e finíssima ironia.
Segundo esse brilhante ser humano, "na esfera econômica, um ato, um hábito, uma instituição, uma lei não geram somente um efeito, mas uma série de efeitos. Dentre esses, só o primeiro é imediato. Manifesta-se simultaneamente com a sua causa. É visível. Os outros só aparecem depois e não são visíveis. Podemos nos dar por felizes se conseguirmos prevê-los." E arremata de forma incisiva: "Entre um bom e um mau economista existe uma diferença: um se detém no efeito que se vê; o outro leva em conta tanto o efeito que se vê quanto aqueles que se devem prever."
No caso do sr. Amorim, o que ele vê são os empregos criados pela reconstrução, os investimentos, o desenvolvimento de alguns setores ligados à construção civil, etc. O que ele não vê é que todo o dinheiro gasto na reconstrução deixou de ser aplicado em outras áreas, em investimentos que ficaram prejudicados em função da emergência decorrente da devastação do Katrina.
Sobre esse tema específico, Bastiat nos conta a pequena história da vidraça quebrada, que demonstra, de forma cabal e inequívoca, o enorme erro de avaliação do sr. Amorim. Vamos, então, a ela:
"Todos os que testemunharam, sensibilizados, o momentâneo ataque de raiva do Bom Burguês Jacques Bonhomme, no dia em que teve uma vidraça quebrada por seu terrível filho, foram unânimes em confortá-lo com palavras do tipo: “há males que vem para bem. São acidentes desse tipo que ajudam a indústria a progredir. É preciso que todos possam ganhar a vida. O que seria dos vidraceiros, se os vidros nunca se quebrassem?”
Supondo-se que seja necessário gastar seis francos para reparar os danos feitos, pode-se dizer, com toda justeza, e estou de acordo com isso, que o incidente faz chegar seis francos à indústria de vidros, ocasionando o seu desenvolvimento na proporção de seis francos. É o que se vê.
Mas se, por dedução, chegarmos à conclusão de que é bom que se quebrem vidraças, de que isso faz o dinheiro circular, de que daí resulta um efeito propulsor do desenvolvimento da indústria em geral, então eu serei obrigado a exclamar: Alto lá! Essa teoria pára naquilo que se vê, mas não leva em consideração o que não se vê.
Não se vê que, se o nosso burguês gastou seis francos numa determinada coisa, não vai poder gastá-la noutra! Não se vê que, se ele não tivesse nenhuma vidraça para substituir, ele teria comprado, por exemplo, um sapato novo, ou posto um livro a mais na sua biblioteca. Enfim, ele teria aplicado seus seis francos em alguma outra coisa, que, agora, não poderá mais comprar. Façamos, pois, as contas da indústria em geral: tendo sido quebrada a vidraça, a fabricação de vidros foi estimulada em seis francos; é o que se vê. Se a vidraça não tivesse sido quebrada, a fabricação de sapatos (ou de qualquer outra coisa) teria sido estimulada na proporção de seis francos; é o que não se vê. Façamos agora as contas de Jacques Bonhomme: Na primeira hipótese, a da vidraça quebrada, ele gasta seis francos e tem, nada mais nada menos que antes: o prazer de possuir uma vidraça. Na segunda hipótese, aquela na qual o incidente não ocorreu, ele teria gastado seis francos em sapatos e teria tido ao mesmo tempo o prazer de possuir um par de sapatos e também uma vidraça.
Ora, como Jacques Bonhomme faz parte da sociedade, deve-se concluir que, considerada no seu conjunto, e fazendo-se o balanço de seus trabalhos e de seus prazeres, a sociedade perdeu o valor relativo à vidraça quebrada.
Daí, generalizando-se, chega-se a esta conclusão inesperada: ”A sociedade perde o valor dos objetos inutilmente destruídos” – e se chega também a este aforismo que vai arrepiar os cabelos dos protecionistas: “Quebrar, estragar, dissipar não é estimular o trabalho nacional”, ou mais sucintamente: ”Destruição não é lucro”.
É preciso que o leitor aprenda a constatar que não há somente dois, mas três personagens no pequeno drama que acabei de apresentar. Um deles, Jacques Bonhomme, representa o consumidor reduzido a ter, por causa da destruição, um só prazer em vez de dois. O outro, sob a figura do vidraceiro, nos mostra o produtor para quem o incidente estimula a indústria. O terceiro é o sapateiro (ou outro industrial qualquer) cujo trabalho é desestimulado também pelas mesmas razões.
É esse terceiro personagem que sempre se mantém na penumbra e que, personificando aquilo que não se vê, é peça fundamental do problema. É ele que nos faz compreender o quanto é absurdo afirmar-se que existe lucro na destruição. É ele que logo nos ensinará que não é menos absurdo procurar-se lucro numa restrição, já que esta é também, no final das contas, uma destruição parcial."
O autor é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
Publicado no MSM

8 de set. de 2005

Falácias Econômicas: o caso da telefonia

Imagine que amanhã o governo institua um preço máximo a ser cobrado pela cerveja. Digamos que esta proibição limite o preço da garrafa de cerveja a R$ 1,00. É proibido vender cerveja a um preço maior que este. Certamente, num primeiro momento, muitos iriam gostar desta iniciativa e se as eleições fossem logo, talvez até Lula se reelegesse. O problema é que uma medida econômica deste cunho não trás os efeitos que aparentemente podem trazer, a saber, a queda do custo da cerveja. O que ocorreria seria a escassez do produto, pelo simples fato de que arcar com os custos de produção da cerveja e vende-la ao preço instituído pelo governo não seria um empreendimento lucrativo. Logo as indústrias mudariam o seu foco de investimento para produtos mais lucrativos e a produção de cerveja seria insuficiente diante da demanda que seria ainda mais crescente. Talvez a produção seria nula. Escassez total da cerveja. A tendência seria o surgimento de um mercado negro da cerveja pressionado por uma demanda que estaria disposta a pagar R$ 5,00 ou mais por uma garrafa do líquido. Ou seja, o decreto governamental, talvez motivado por boas intenções, na verdade arruinou o mercado de cervejas, enquanto que aqueles que estão dispostos a tomar a bebida, a encontrariam apenas no mercado negro, com todos os riscos inerentes à empreitada.

Muito bem. Algo muito parecido tem circulado via e-mail pedindo para que todos os usuários de telefonia liguem para um telefone 0800 a fim de pressionar os deputados a aprovarem um projeto de lei que derruba a taxa básica em torno de R$ 40,00 cobradas mensalmente em nossas contas telefônicas pelas operadoras. Aquela taxa fixa cobrada dos usuários independente da quantidade de ligações que fazem.

Ocorre que esta intenção do congresso em derrubar a cobrança da taxa fixa, embora possa ser bem intencionada, ela sofre do idêntico problema do exemplo da cerveja. Em outras palavras, se o congresso derrubar a cobrança da taxa básica sobre a telefonia, ela não surtirá os efeitos que os legisladores prevêem, isto é, ela não reduzirá os custos da telefonia para nós usuários.

A questão é muito simples, mas ás vezes, a visão míope que temos não nos permite enxergar, como no caso hipotético acima dos afoitos eleitores de Lula.

Decorre que esta taxa básica hoje cobrada pelos serviços de telefonia faz parte do contrato estabelecido entre o governo e as operadoras quando da realização do contrato para a oferta do – importante – serviço de telefonia em nosso país.

O ponto é que os R$ 40,00 aproximados cobrados mensalmente de cada um de nós, representa milhões na receita mensal das operadoras. Uma vez que o direito a cobrança desta taxa seja eliminada pelo projeto governamental, isto significará a perda de milhões para as operadoras. Inevitavelmente, o resultado disso será um impacto de tal monta sobre as operadoras que elas se virão obrigadas a rever os preços das ligações, i.e., elas aumentarão os preços das ligações até o ponto em que as perdas provocadas pela extinção da taxa básica, sejam contrabalançadas pelos ganhos oriundos do aumento das tarifas. Neste caso nós não seríamos beneficiados pela queda dos custos, como quer supor o projeto dos nossos burocratas.

Mas aí alguém, ainda mais bem intencionado, poderá sugerir que o governo também proíba a elevação das tarifas telefônicas evitando que a situação continue a mesma. Novamente, nos deparamos com o exemplo da cerveja. As operadoras, seriam obrigadas a deixar o ramo e nós ficaríamos numa situação ainda pior, pois estaríamos sem o serviço de telefonia. É simples assim. Assim como as leis da física, as leis econômicas são irrevogáveis.

Não quis entrar no “detalhe” de que a extinção da cobrança básica significa quebra de contrato e que isto se traduz em dramáticas conseqüências ao país que precisa de investimentos externos.

Portanto, se o governo derrubar a cobrança da taxa básica sobre os serviços de telefonia, na melhor das hipóteses não adiantará de nada. Na pior, sofreremos um "apagão" telefônico. Como dizem os economistas americanos: there is no free lunch.

6 de set. de 2005

Seis Mitos sobre o Libertarianismo

> Os libertários acreditam que cada indivíduo é um ser isolado e não se influenciam mutuamente.
> Os libertários são libertinos e hedonistas.
> Os libertários não acreditam em princípios morais.
> Os libertários são ateístas e materialistas e negligenciam o lado espiritual da vida.
> Os libertários são utópicos e acreditam que todas as pessoas são boas e que, por esta razão, não há necessidade do controle estatal.
> Os libertários acreditam que toda pessoa conhece o seu próprio interesse melhor que as outras pessoas.

Há mais mal-entendido a respeito do libertarianismo do que críticas fundamentadas, a exemplo das asserções acima que são muito difundidas entre os críticos da doutrina. Mas não passam de mitos, como comprova Murray N. Rothbard, derrubando um por um, neste esplêndido artigo.